É LÍCITO O SUICÍDIO

assessoria 07/08/2013 - 11:45:21 Artigos

No âmbito da moralidade e da religiosidade, muitos condenam os suicidas (e também aqueles que tentam o suicídio), com a ideia de que eles “cometem grave pecado”, “não herdam o reino dos céus” ou “vão para o inferno”!
Prevalece no aspecto religioso a premissa de que o suicídio atenta contra os direitos de Deus, porque é Ele o único Senhor da vida e da morte. Por outro lado, há ateístas (que não creem na existência de Deus) que entendem o suicídio como “expressão máxima da liberdade”!
Para o espiritismo, de modo geral, aquele que atenta contra a própria vida sai de um estado de sofrimento para entrar noutro pior, de “tortura”, “pesadelo”, “solidão” e “trevas”...
Há pesquisas indicando que pessoas com maior religiosidade têm menor tendência à prática suicida do que aqueles sem afiliação religiosa.
Para o Direito Natural, que serviu de importante parâmetro à criação/formação do Direito Positivo nos moldes atuais, há alguns princípios diretamente impostos pela natureza humana, e que se referem, portanto, às tendências naturais do ser humano, a exemplo dos deveres do homem para consigo mesmo, tais como “o homem deve conservar-se, deve perseverar no ser, não deve destruir-se”; e ainda o dever de respeitar sua racionalidade, isto é, sua inteligência, como “o homem deve procurar a verdade”, “buscar o conhecimento da realidade”, e tais premissas de moralidade, por óbvio, não se harmonizam com o suicídio.
Um dos maiores pensadores de todos os tempos, Tomás de Aquino, dizia acerca do suicídio que quem se priva a si mesmo da vida peca contra Deus, e que suicidar-se para evitar outras misérias desta vida é preferir um mal maior a fim de evitar um mal menor.
Ingressando especificamente no mundo jurídico, e em resposta ao questionamento feito no título do artigo, o Código Civil estabelece no artigo 13 que “Salvo por exigência médica, é defeso (proibido) o ato de disposição do próprio corpo, quando importar diminuição permanente da integridade física, ou contrariar os bons costumes”. No parágrafo único do referido artigo consta que “O ato previsto neste artigo será admitido para fins de transplante, na forma estabelecida em lei especial”.
É possível e lógico concluir, por conseguinte, que se condutas menos lesivas são ilícitas, a exemplo de extirpação de um membro ou da retirada de um órgão, mais ainda a interrupção da vida, ou seja, o suicídio, que deve sim ser classificado como ato ilícito, embora não punível nem na forma tentada, menos ainda (por óbvio) no modo consumado. O suicídio, apesar da referida ilicitude, não apresenta natureza criminal.
Ainda na órbita civil, é de interesse mencionar a Súmula nº 105 do Supremo Tribunal Federal, a estabelecer que “Salvo se tiver havido premeditação, o suicídio do segurado no período contratual não exime o segurador do pagamento do seguro”, e também a Súmula nº 61 do Superior Tribunal de Justiça, a indicar que “O seguro de vida cobre o suicídio não premeditado”.
Como os referidos enunciados davam ensejo a muito subjetivismo e também a possíveis decisões injustas, o artigo 798 do Código Civil apresentou previsão caracterizada por maior objetividade, a estabelecer que “O beneficiário não tem direito ao capital estipulado quando o segurado se suicida nos primeiros dois anos de vigência inicial do contrato, ou da sua recondução depois de suspenso (...)”, e o parágrafo único do precitado artigo prescreve que “(...) é nula a cláusula contratual que exclui o pagamento do capital por suicídio do segurado”.
Perdeu força (mas não validade), portanto, a questão relacionada à premeditação ou não. É que o Enunciado 187, aprovado na III Jornada de Direito Civil do CJF/STJ, a fim de criar mecanismo interpretativo e aplicativo do direito mais equilibrado e consentâneo com as especificidades de cada caso concreto, prevê que “Nos contratos de seguro de vida, presume-se, de forma relativa, ser premeditado o suicídio cometido nos dois primeiros anos de vigência da cobertura, ressalvado ao beneficiário o ônus de demonstrar a ocorrência do chamado ‘suicídio involuntário’”.
Na seara penal, de relevo anotar que embora não constitua crime o suicídio, o artigo 122 do Código Penal prevê que induzir ou instigar alguém a suicidar-se, ou prestar-lhe auxílio para que o faça, configura infração penal, e das graves, vez que a pena será de reclusão de dois a seis anos, se o suicido se consumar, e de um a três anos, se da tentativa de suicídio resultar lesão corporal de natureza grave.
Também estabelece o Código Penal que a pena deve ser duplicada se o crime é praticado por motivo egoístico, e ainda se a vítima é menor ou tem diminuída, por qualquer causa, a capacidade de resistência.
Tendo em vista os pontos sinteticamente abordados, conclui-se que no Brasil o suicídio se caracteriza pela ilicitude, embora sem caráter penal.
Finalmente, a título de informação, cumpre especificar que entre os países com maiores índices de suicídio estão Coréia do Sul, Lituânia, Guiana, Cazaquistão, Bielorússia, China, Japão, Hungria, Sri Lanka e Rússia.
Avante e VIDA digna a todos!

Daniel Marques de Camargo é Advogado e professor das FIO. Mestre em Ciência Jurídica (UENP). Especialista em Processo Civil (UNAERP). Autor de obras jurídicas diversas e palestrante.





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