CARGOS EM COMISSÃO, IRREGULARIDADE E CONSEQUÊNCIAS JURÍDICAS PARA O SERVIDOR E AUTORIDADE NOMEANTE.

Adelino Lorenzetti Neto 28/04/2014 - 08:52:45 Artigos

Cada poder deve exercer seus misteres com a única e exclusiva limitação posta pela Constituição e jamais pelos demais poderes, pois a atividade legiferante e fiscalizatória do Legislativo somente admite intromissões nos demais poderes quando constitucionalmente autorizadas.

Denomina-se Teoria dos Freios e Contrapesos aquela segundo a qual os Poderes atuam com limitações exercidas pelos outros.

Apesar de não ser possível encontrar expressamente no texto constitucional a expressão supra, seu sentido está presente em diversos artigos da norma máxima.

Exemplifica-se o controle de um poder sobre o outro com a própria existência dos Tribunais de Contas, órgãos vinculados ao Poder Legislativo, porém voltados ao auxílio no controle de todos os poderes, na forma e limites previstos na Constituição.

Outra faceta interessante é a atribuição dada ao Poder Judiciário para declarar a inconstitucionalidade de normas abstratas, retirando do mundo jurídico com efeito vinculante, erga omnes e retroativo (conforme o caso concreto) ato editado por outro poder.

O chefe do executivo, por seu turno, detém a atribuição de vetar projetos de lei aprovados, caso os entenda inconstitucionais ou, simplesmente, contrários ao interesse público.

Tal teoria é perfeitamente aceita pelo Excelso Pretório.

“A fiscalização legislativa da ação administrativa do Poder Executivo é um dos contrapesos da CF à separação e independência dos Poderes: cuida-se, porém, de interferência que só a Constituição da República pode legitimar. Do relevo primacial dos 'pesos e contrapesos' no paradigma de divisão dos poderes, segue-se que à norma infraconstitucional – aí incluída, em relação à Federal, a constituição dos Estados-membros –, não é dado criar novas interferências de um Poder na órbita de outro que não derive explícita ou implicitamente de regra ou princípio da Lei Fundamental da República. O poder de fiscalização legislativa da ação administrativa do Poder Executivo é outorgado aos órgãos coletivos de cada câmara do Congresso Nacional, no plano federal, e da Assembleia Legislativa, no dos Estados; nunca, aos seus membros individualmente, salvo, é claro, quando atuem em representação (ou presentação) de sua Casa ou comissão.” (ADI 3.046, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, julgamento em 15-4-2004, Plenário, DJ de 28-5-2004. Original sem destaques.)

“Separação e independência dos poderes: freios e contra-pesos: parâmetros federais impostos ao Estado-membro. Os mecanismos de controle recíproco entre os poderes, os ‘freios e contrapesos’ admissíveis na estruturação das unidades federadas, sobre constituírem matéria constitucional local, só se legitimam na medida em que guardem estreita similaridade com os previstos na Constituição da República: precedentes. Consequente plausibilidade da alegação de ofensa do princípio fundamental por dispositivos da Lei estadual 11.075/1998-RS (inciso IX do art. 2º e arts. 33 e 34), que confiam a organismos burocráticos de segundo e terceiro graus do Poder Executivo a função de ditar parâmetros e avaliações do funcionamento da Justiça (...).” (ADI 1.905-MC, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, julgamento em 19-11-1998, Plenário, DJ de 5-11-2004.)

Portanto, é possível compreender razoavelmente a Separação dos Poderes à luz da Constituição Federal sem a necessidade de maiores divagações.

- Formas de Investidura no Serviço Público

A maneira como os indivíduos ingressam no serviço público é matéria de grande relevância.

Isso porque o acesso a tal atividade possui mais de um aspecto.

Um deles é que o interesse público (aliado ao novel Princípio da Eficiência exige pessoas qualificadas e, portanto, aptas a contribuir da melhor forma possível para o progresso da administração, com sua competência e preparo.

Além disso, a possibilidade de estabilidade financeira e a tendência de se valorizarem as diversas carreiras integrantes do serviço estatal tornam necessária uma regulação constitucional transparente e justa, para que todos os indivíduos que preenchem as condições necessárias tenham oportunidade de ingressar em tais atividades.

De tal modo, a Constituição Federal de 1988 não vacilou ao estabelecer regras de acesso ao serviço público.

Geralmente, o ingresso se dá por meio de concurso público de provas ou provas e títulos, de acordo com a complexidade do cargo ou emprego.

Outra forma, contudo, é a nomeação para funções de confiança e cargos em comissão.

Por se tratar de exceção à regra constitucional (que é o preenchimento das vagas antecedido por concurso público), esses cargos e funções de livre nomeação somente existem quando criados por lei e por ela assim rotulados de maneira expressa.

Apesar disso, existe limitação constitucional à liberdade de definição de cargos ou funções como sendo em comissão ou de confiança. A lei somente poderá assim considerá-los quando se tratar de agentes públicos com atribuições de direção, assessoramento ou chefia.

Nessas situações, a escolha dos ocupantes é feita pelo gestor, sendo certo que as funções de confiança são exercidas por servidores ocupantes de cargo efetivo, enquanto os comissionados têm indicação livre pela autoridade nomeante, com as qualificações exigidas por lei.

Existe, ainda, a possibilidade de contratação por necessidade temporária de excepcional interesse público, em conformidade com o artigo 37, inciso IX, da Constituição Federal.

- IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA POR FRUSTRAÇÃO À LICITUDE DE CONCURSO PÚBLICO

A improbidade administrativa pode configurar-se através de atos que provocam o enriquecimento ilícito do agente, de atos que provocam prejuízos ao Erário ou mesmo atos que, ainda que não se enquadrem nas duas situações anteriores, atentem contra os princípios da Administração Pública.

Tratando dessa última modalidade, a Lei 8.429/92 estabeleceu, em seu artigo 11, que “constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente...”.

No entanto, a violação pode ser verificada a partir dos vetores representados pelos deveres supra, bem como pelas situações exemplificativas arroladas no artigo 11, cuja parte final contém o termo “notadamente” e, a partir de então, passa a enumerar hipóteses concretas.

O concurso público é expressão direta das noções de moralidade, impessoalidade e eficiência administrativa, pois representa a possibilidade de todo e qualquer indivíduo – seja ele brasileiro ou estrangeiro, nos casos legalmente permitidos – ocupar cargos públicos existentes, obedecendo, por óbvio, às exigências legais.

É também através da realização de concurso público que se selecionam isonomicamente os sujeitos mais bem instruídos para exercer seus misteres junto ao Estado, o que proporciona, objetivamente, maior qualidade e preparo da mão de obra empregada nos afazeres da administração pública.

Destarte, não obstante se reconheça que a criatividade de maus gestores sempre empreenda modos ardis de transgressão às normas constitucionais, exploram-se três situações de nomeação de servidores públicos sem o necessário certame seletivo – afora as conjunturas constitucionalmente albergadas – ao tempo em que se debate a possível improbidade administrativa nos casos correlatos.

- Cargos em comissão com atribuições constitucionais, nomeação regular e exercício ilegal

Outra circunstância ilegítima é aquela em que a lei cria cargos em comissão e o gestor, apesar de nomear indivíduos para tais funções, emprega-os de fato em tarefas de caráter subalterno.

Afinal de contas, com um pouco de afinco, não é difícil encontrar servidores “comissionados” exercendo atividades de motorista, auxiliar de escritório, porteiro, auxiliar de serviços gerais etc.

Sem embargo disso, o gestor que se deparar com tal situação tem a faculdade de iniciar processo legislativo apto a corrigir o vício legal, com base na atribuição que lhe confere a Constituição Federal.

Assim, por exemplo, a iniciativa reservada das leis que versem sobre o regime jurídico dos servidores público revela-se, enquanto prerrogativa conferida pela Carta Política ao Chefe do Poder Executivo, projeção específica do princípio da separação dos poderes, incidindo em inconstitucionalidade formal a norma inscrita em Constituição do Estado que, subtraindo a disciplina da matéria ao domínio normativo da lei, dispõe sobre provimento de cargos que integram a estrutura jurídico-administrativa do Poder Executivo local.” (MORAES, 2007. p. 621-622)

Discutir improbidade administrativa requer a consciência de que se explora um tema em voga na opinião pública, tanto pelo interesse de tantos indivíduos que são prejudicados ou beneficiados por tais atos, quanto pelo legítimo desabono à malversação da coisa pública.

Ademais, viu-se que, salvo as exceções constitucionais, o administrador não pode contratar servidores sem o necessário concurso público, caso em que, de fato, estará sujeito às penalidades da Lei 8.429/92, afastando-se, contudo, a subsunção desses casos à modalidade específica do inciso V do art. 11 – comumente empregado de forma inadequada.

Nos dois subtítulos seguintes, restou evidente que, uma vez determinadas em lei as atribuições de um cargo, não pode o nomeante determinar ao nomeado o exercício de outras.

Conseqüência disso é que, uma vez empregado o agente em atividade diversa daquela legalmente estabelecida, ocorre improbidade por parte deste (art. 2ª) e do gestor que assim determinou.

POR: DRº ADELINO LORENZETTI NETO – PROMOTOR DE JUSTIÇA NA CIDADE DE OURINHOS.

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