O GRÁFICO QUE ERA JORNALISTA

AURÉLIO ALONSO 13/11/2012 - 15:02:44 Artigos

Por Aurélio Fernandes Alonso

"Não sou jornalista. Tenho quarto ano primário". Assim Vanderlei Marcante gostava de responder quando perguntado quando publicava suas matérias no Jornal do Povo.

Começou como impressor e passou por vários jornais de Ourinhos e Santa Cruz do Rio Pardo. A longa trajetória dentro de oficinas gráficas vendo o pulsar do jornalismo diário o contagiou.

No documentário produzido recentemente que conta a história da eleição municipal de 1988, vencida por Clóvis Chiaradia, a imagem que abre é da gráfica do Jornal da Divisa sob o burburinho de um rádio e aparece justamente Vanderlei preparando a chapa da edição que anuncia os resultados da eleição.
Vivenciou as dificuldades de Benedicto da Silva Eloy no comando do JD. Quando ainda não havia as impressões coloridas, Vanderlei Marcante foi responsável por uma proeza. Foi um dos primeiros a adotar um sistema de impressão colorida utilizando equipamentos off set prá lá de arcaico. O sistema de colorizar fotolito à mão, com uso de retícula, possibilitou ao Jornal da Divisa ser um pioneiro entre as décadas de 80 e 90.

O sistema de colorização só veria a se solidificar anos depois com a aquisição de novos equipamentos. Embora sempre no comando de impressoras, Vanderlei era uma pessoa impaciente. Cansado da linha editorial do Divisa, com passagens pelo Debate de Santa Cruz do Rio Pardo onde trabalhava na impressão, decidiu incentivar Mário Teixeira a abrir um segundo jornal diário de Ourinhos. Nasceu, então, o Jornal do Vale. Não durou muito na administração Esperidião Cury. Foi uma tentativa de incentivar a criação de mais periódicos na cidade.

A concorrência incentivou a melhora do Jornal da Divisa com a contratação de Sergio Alves, mas Vanderlei ainda migraria para a atuação política.
Detonou o escândalo do caso Engesp na gestão de Toshio Misato que resultou no afastamento do prefeito e de assessores do primeiro escalão. Não era o mensalão da época, porém havia um esquema ilegal de financiar uma pequena construtora na prestação de serviços da administração.

Nesse período, Vanderlei usou a força do rádio. O radialista Alfredo Sampaio tinha um programa por volta do meio-dia na Sentinela que abria espaço via telefone para a participação de ouvintes. Vanderlei detonava a administração, o que rendeu algumas ações judiciais (todas arquivadas), mas o deixou bem popular. Dali foi fácil viabilizar uma candidatura a vereador pelo PV.

Eleito, não conseguiu manter o ritmo denuncista. Nesse período montou em um barracão na Expedicionários um salão para bailes, onde havia aula de informática da Associação Feliz.

Apesar da obra social, não a usou politicamente para se reeleger vereador. Posteriormente, contou que ficou desgostoso com a política partidária. Dentro da Câmara, percebeu a dificuldade para a atuação parlamentar.
Todo funcionário de jornal sonha ter um jornal próprio. Também montou o Jornal do Povo. A publicação não tinha periodicidade fixa, mas pelas páginas denunciou fraude na balança de pesagem de uma empresa terceirizada do governo Claury, publicou reportagem com um cortador de cana que sofreu queimaduras graves pelo corpo e fez muitas campanhas para ajudar necessitados.

Teve seus 15 minutos de celebridades quando esteve no programa de Gilberto Barros na Record, quando acompanhou o cortador de cana queimado em canavial. Iniciou uma longa batalha contra a Usina São Luiz até a Justiça homologar um acordo.

Sempre viveu com dificuldades por causa de seu ativismo político. Descobriu a Internet quando já não conseguia manter o JP impresso. Nas últimas eleições decidiu se engajar na campanha de Bélkis Fernandes. Usava o Facebook para emitir opiniões e polemizar.

Já doente, internado na UTI da Santa Casa com dificuldades de respiração, pedia às enfermeiras para atender a paciente do lado e não ele. "Ela precisa mais do que eu". Também pedia para que orassem para outras doentes mais necessitados.

Tinha uma preocupação com a Santa Casa, mas sempre enxergou o hospital como muito importante para atender a população mais pobre.
Sempre foi uma pessoa preocupada com mais necessitados. Fumava muito e tomava muito café, o que agravou o se estado de saúde. O assunto preferido era político, aprendeu vendo as disputas acirradas, mas tinha uma visão pessimista. Na terça-feira, dia 13 de outubro, após mais de duas semanas hospitalizado, Vanderlei Marcante decidiu partir. Deixou um legado de participação comunitária com erros e muitos acertos. A imprensa de Ourinhos ficou de luto. Sempre foi o amante do jornalismo impresso. Se identificava com o jornalista Alberto Dines apresentador de um programa sobre impressa na TV Brasil. Não cursou jornalismo, mas fez muitas reportagens polêmicas e investigativas. Foi engajado e sempre tomou partido, sem ficar no manto da suposta imparcialidade.

Aurélio Fernandes Alonso, amigo pessoal que acompanhou a trajetória do ex-vereador e gráfico

Publicidade

Parceiros