MPT ENCONTRA ALOJAMENTOS PRECÁRIOS DE CORTADORES DE CANA EM SANTA CRUZ DO RIO PARDO E MANDURI.

JC - Bauru 22/10/2013 - 12:22:39 Região

(Fonte: Aurélio Alonso – JC NET)

Com apoio da Polícia Rodoviária Federal, Ministério Publico do Trabalho encontrou três residências em estado precário em Santa Cruz do Rio Pardo.

Denúncia anônima à Polícia Federal (PF) possibilitou ontem (segunda-feira 21/10) ao Ministério Público do Trabalho (MPT) flagrar condições precárias em alojamentos de cortadores de cana-de-açúcar vindos dos Estados de Pernambuco e Ceará nas cidades de Manduri (121 quilômetros de Bauru) e Santa Cruz do Rio Pardo (90 quilômetros de Bauru). O agenciador de mão de obra Amauri Cesar Santos de Lima é acusado de ter feito as contratações. Ele poderá responder pelo aliciamento e de submeter trabalhadores análoga à de escravo.
A reportagem do JC e do REPÓRTER NA RUA acompanhou a fiscalização do MPT ontem à tarde que contou com ajuda da Polícia Rodoviária Federal (PRF).
Os fiscais foram alertados, a partir de uma comunicação telefônica das precariedades no alojamento de Manduri que chegou à PF de Bauru na sexta-feira.
Ao todo 44 trabalhadores vieram do Nordeste para cortar cana para a Usina Santa Maria de Cerqueira Cesar, na região de Avaré. Até o fechamento desta edição, a reportagem não conseguiu contato com nenhum representante da empresa e nem com a Agrícola Favarin & Zanatta. Ela deverá ser procurada hoje pelo Ministério Público do Trabalho que vai propor um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC).
A fiscalização foi acompanhada pelo coordenador Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo, Jonas Raier Moreno, que criticou as condições precárias encontradas nos alojamentos. Neste ano, em todo o País já foram resgatados 2.750 trabalhadores em trabalho escravo contra 2.500 no ano passado.
O procurador Luis Henrique Rafael verificou irregularidades também no ônibus de transporte dos trabalhadores. As facas e ferramentas viajavam junto com os trabalhadores, o que não pode.
O procurador do MPT Marcus Vinicius Gonçalves afirmou ao JC que, em tese, foram praticados dois tipos de crime: o de aliciamento, pelo fato de o “gato” (agenciador) ir a Pernambuco trazer os trabalhadores bancado pelo usina e de submeter às pessoas a situação análoga à de escravo. Segundo ele, as condições de alguns alojamentos eram precárias, como o da rua Goiás 1.241 em Manduri. Nesta casa onde residia mais de 10 pessoas, a ventilação era péssima. Já alojamento da avenida Jesus Gonçalves 1.250 em Santa Cruz do Rio Pardo foi considerado o de pior condição. “Não tem cama adequada, roupa de campa, local para sentar para comer. Pelo contexto, as condições são degradantes”, disse Gonçalves.
Ainda hoje a PF será informada sobre a operação porque caberá ao Ministério Público Federal entrar com ação penal contra o agenciador com base no levantamento da fiscalização. O MPT pretende acionar a usina para que tome as providências para a melhoria das condições de trabalho dos alojamentos. “Se a empresa não ajustar voluntariamente, deveremos entrar com uma ação civil pública,” declara.
Para coordenador, impunidade favorece trabalho escravo
O coordenador Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo do Ministério Público do Trabalho, Jonas Raier Moreno, veio especialmente acompanhar a fiscalização em Manduri. Ele afirmou que o trabalho escravo ainda está presente no Brasil, principalmente no setor rural.
Neste ano foram resgatados 2.750 trabalhadores. “São números vergonhosos. O Estado brasileiro vem combatendo, mas a legislação trabalhista é branda quanto às multas. Eles (os transgressores da lei) acreditam na impunidade”.
Submeter alguém a condição análoga à de escravo, quer submetendo-o a trabalhos forçados ou a jornada exaustiva, quer sujeitando-o a condições degradantes de trabalho, quer restringindo, por qualquer meio, sua locomoção em razão de dívida contraída com o empregador ou preposto é crime previsto no artigo 149 do Código Penal. A pena é reclusão, de dois a oito anos, e multa.
Moreno declarou que em um alojamento de Santa Cruz do Rio Pardo as normas trabalhistas estavam todas sendo descumpridas. Ele cita por exemplo, espaçamento de cama, falta de roupa de cama, colchões fora de padrão e condições de higiene ruins.
A reportagem flagrou o esgoto escoando no fundo de uma edícula, falta de vaso sanitário em banheiro e colchões no chão. Os armários não eram individuais.
O alojamento precário era de colhedores de laranja que residiam nos fundos da casa onde estavam alojados 10 cortadores de cana que vieram de Pernambuco para trabalhar para a usina Santa Maria de Cerqueira Cesar.
“Trabalhador aqui absolutamente foi colocado à margem de qualquer padrão civilizatório. Ele não tem a sua dignidade preservada”, declarou o coordenador.
Moreno explicou que quando o empreendedor se dispõe a trazer trabalhador de outro Estado tem que dar boas condições de moradia. “Houve aliciamento com falsas promessas. Promete-se dar cesta básica e que não haveria descontos, depois começa a descontar tudo”, declara.
Durante a fiscalização foi constatado que trabalhadores contribuíam com parte do pagamento do aluguel, contas de água e luz. Em depoimento aos procuradores, o agenciador admitiu que a usina também ajudava no pagamento das despesas de locação.
O Ministério do Trabalho Emprego será comunicado das irregularidades trabalhistas para fazer as autuações.

Aliciamento de nordestinos
Os canaviais da região a cada safra recebe mão de obra nordestina. É comum aliciar trabalhadores de Pernambuco, Ceará e Alagoas. Com o agravamento da seca naquela região, alguns resolvem tentar a sorte no Sudeste.
É o caso de José Alexandre Silva, de 45 anos, que veio de Angelim (PE) para Manduri em abril e tinha planos de deixar a cidade até novembro. “A hora certa para voltar a gente não sabe, depende de quando acaba a safra, mas tudo indicava que seria novembro”, conta. Quando foi convidado para cortar cana em Manduri, houve promessa de não pagar aluguel, fornecimento de cesta básica e boas condições de moradia. “Foi uma decepção grande. Aqui a gente paga tudo”, declarou.
Ele veio junto com amigos. A viagem de 2.627 quilômetros durou três dias. Silva já trabalhou em usinas de Alagoas. “Não tem como um cabra chegar aqui e ganhar bem com todos esses descontos”, declara.
O trabalhador José Soares dos Santos, de 42 anos, veio de Canhotinho (PE) em 5 de abril deste ano e trabalhava em usina. “Quando me convidaram prometeu que aqui seria um bom negócio. O preço da cana seria (fixado) pela usina, mas isso só ocorreu durante dois dias e passou ser dado pelo cabra que contratou”.
Segundo o procurador do MPT, é uma irregularidade grave o preço da cana cortada ser estipulado pelo agenciador e não pela usina. Santos contou que houve caso que depois de fechar o mês o preço da cana já cortada foi estipulado. “Tenho oito viagens para Espírito Santo, mas nunca viajei para cair numa enrascada dessa. Pensava que iam respeitar os nosso direitos.”

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